A discussão sobre o chamado “passaporte da vacina”, a exigência de vacinação para acessar determinados lugares, surge quando mais de 60% da população brasileira já tomou a primeira dose e quase 30% está completamente imunizada. Alguns municípios e instituições já definiram que vão restringir o acesso dos não imunizados.
No Rio de Janeiro, a prefeitura vai obrigar, a partir de 1º de setembro, a comprovação de vacinação para acesso a academias, clubes, estádios, cinemas, pontos turísticos, entre outros. Florianópolis segue a mesma iniciativa, proibindo os não vacinados de frequentarem bares, hotéis e eventos. Existem também universidades públicas exigindo vacinação completa para o retorno presencial.
E nos condomínios? O síndico pode proibir que moradores não vacinados frequentem áreas de lazer? E essa proibição pode ser aplicada em quais áreas? Essas questões esquentaram o debate entre especialistas em direito condominial e aqui nós oferecemos respostas para guiar o síndico em meio à discussão.
O condomínio pode proibir o morador não vacinado de frequentar áreas de lazer?
A resposta ainda não é clara, pois até o momento não existe nenhuma legislação ou decisão de tribunal específica a respeito do tema. No entanto, diferentes especialistas já apresentaram argumentos contra e a favor da proibição.
Aqueles que acreditam na validade do passaporte da vacina citam a decisão do STF que proíbe os cidadãos de serem forçados a se vacinar, mas permite que restrições sejam aplicadas aos não vacinados.
Os advogados Julio Brotto e Pedro Gallotti, fazem parte desse grupo. Em artigo publicado na Folha de S. Paulo, eles defendem que o interesse coletivo prevalece sobre o interesse individual e citam uma decisão do STJ para defender a tese. Em ambos os casos, do passaporte da vacinação e da decisão do STJ sobre AirBnb no condomínio, o interesse do coletivo de condôminos prevalece sobre o interesse individual do condômino.
Outros artigos publicados por advogados nos portais Conjur e Migalhas corroboram com a ideia.
O advogado e sócio-fundador da Nardes Badaró Advocacia, Thiago Badaró, defende uma posição mais cuidadosa. Para ele, a questão chave nessa discussão são os direitos constitucionais do condômino. Segundo Badaró, “a convenção ou as decisões da assembleia jamais podem contrariar as leis e tampouco a Constituição Federal”.
O Professor da ESA/OAB-SP cita decisões prévias do STJ, que permitem aos devedores a utilização de áreas comuns do condomínio, para mostrar que o limite entre os direitos do condômino e os interesses da comunidade é complexo.
Segundo Badaró, “para que o síndico consiga adotar uma medida restritiva ao morador, precisa existir a comprovação de que aquele morador traz algum risco para o condomínio”. E o síndico precisa ter provas concretas de que o morador apresenta esse risco. Um exemplo seria um teste comprovando que o morador está infectado pela Covid-19.
Assim, a atitude mais adequada de um(a) síndico(a) nessa situação é procurar o aconselhamento de um advogado. E, novamente, como ainda não existem leis ou decisões da justiça claras a respeito do tema, a adoção do passaporte da vacina em um condomínio pode parar em um tribunal.
Se a proibição for permitida, como ela deve acontecer?
Os especialistas que mencionamos acima apontam a convenção e o regimento interno do condomínio como documentos onde essa proibição deve estar presente. No caso da convenção, é necessária a aprovação em reunião de assembleia de dois terços (⅔) dos condôminos para estabelecer a regra.
A proibição se estende a todas as áreas comuns ou somente às áreas de lazer?
A proibição em questão aqui se aplica somente às áreas de lazer do condomínio: academia, salão de festas, quadra esportiva, etc. Isso porque o Código Civil não permite que os condôminos e moradores tenham o seu direito de acessar áreas comuns como corredores e o hall de entrada restringido:
Art. 1.331, §2º – O solo, a estrutura do prédio, o telhado, a rede geral de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, a calefação e refrigeração centrais, e as demais partes comuns, inclusive o acesso ao logradouro público, são utilizados em comum pelos condôminos, não podendo ser alienados separadamente, ou divididos.
Art. 1.331, §4º – Nenhuma unidade imobiliária pode ser privada do acesso ao logradouro público.
Qual deve ser a posição do síndico nesse assunto?
O papel do síndico em meio a essa discussão deve ser de cautela, como destacou Badaró. A importância de uma assistência jurídica fica clara aqui. Portanto, a orientação aos síndicos é que procurem conversar com a sua comunidade a respeito do passaporte da vacina. O síndico pode, inclusive, promover uma campanha de conscientização sobre a vacinação no condomínio.
E talvez essa seja uma discussão desnecessária no seu condomínio, caso todos os moradores estejam vacinados. O aplicativo TownSq pode ajudar a obter essa informação através da função “enquete”. Ela permite que o gestor pergunte o status de vacinação dos moradores, um primeiro passo para saber se a adoção do passaporte da vacina é interessante para o condomínio.
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